segunda-feira, 4 de outubro de 2010

"Ossadas encontrdas em Itaipu"

Transcrevo texo que encaminhei ao jornalista responsável pela reportagem sobre vestigíos de antiga civilização nômade que habitou a Duna Grande em Niterói


Danilo Motta,
Referência:
“Ossadas são encontradas em Itaipu” - Caderno Niterói de O Globo de 03-10-2010

Tenho viva a emoção sentida, quando há dez anos, em trabalho conjunto de equipe do IPHAN e da Prefeitura de Niterói, avistei sobre a Duna Grande restos de uma fogueira, ali, provavelmente há cerca de dois mil anos. Descoberta pelo vento, por ele foi novamente coberta e, assim permaneceu protegida – nela não tocar foi, para o caso, a orientação da equipe do IPHAN.
Havia descoberto nesse trabalho com o IPHAN a relevância do patrimônio arqueológico de Niterói: a Duna Grande é símbolo arqueológico nacional e no Sambaqui de Camboinhas foram encontrados os vestígios mais antigos, cerca de 8 mil anos, dos bandos nômades que habitaram o litoral brasileiro. O novo conhecimento certamente aumentou a emoção sentida ao vislumbrar, através de restos, o fogo que aqueceu a família nômade.
O que aqui quero expor é o despreparo daqueles que, não sendo do IPHAN e mesmo ignorando a instituição, lidam com o patrimônio cultural brasileiro. Tramita na Assembléia Legislativa do Rio de Janeiro projeto de lei que amplia o Parque Estadual da Serra da Tiririca, com o objetivo de “proteger” o entorno da Lagoa de Itaipu. Perplexa, constatei – atualmente trabalho na assessoria do deputado Comte Bittencourt – que a delimitação da área a ser protegida com sua inclusão na unidade de conservação não contempla parte do sítio arqueológico da Duna Grande. Elaborei para o deputado texto de emenda ao projeto corrigindo os limites, que dividia em duas partes o símbolo arqueológico nacional. Ao apresentar a emenda na única audiência de discussão do projeto, fui acusada por participantes “raivosos” de querer tão somente “atrasar” a votação. Ouvi do presidente do INEA que a exclusão de parte da duna e, pasme, do próprio espelho d’água da lagoa e de significativo manguezal – para os quais também apresentei proposta de inclusão no parque - seria para evitar conflitos com invasores que construíram suas casas sobre a duna e com pescadores (na unidade de conservação Parque Estadual a pesca profissional não é permitida).
Essas áreas ambientais protegidas – unidades de conservação – foram estabelecidas em legislação nacional, acompanhando tendência internacional, para, de fato e com a presença no local do poder público, proteger bens do patrimônio natural e cultural. É fundamental a solução dos conflitos com a participação de todos os envolvidos – esta afirmação é apresentada e reiterada em entrevistas sobre proteção ambiental por Washington Novaes. Se o Parque Estadual não é adequado, pode ser utilizada outra unidade de conservação ou mesmo criado um novo tipo de unidade, o que a legislação federal, Sistema Nacional de Unidades de Conservação, permite.
O que não podemos é produzir leis, fingindo que estamos protegendo o meio ambiente, mas traduzindo-se apenas em estratégia para alcançar outros objetivos (cabe a você pesquisá-los). É a desmoralização de nossa legislação protetora do patrimônio de relevância ambiental e cultural e, sem dúvida, a abertura legal para sua destruição.
Menos de um ano depois, leio a descoberta de mais um bem – ossadas humanas no sítio arqueológico da Duna Grande - de interesse não só dos pesquisadores, como diz a reportagem, mas da preservação da memória da cidade e do Brasil.
Só posso dizer: ainda bem que o projeto de lei, dito protetor, mas que desprotegeu nosso símbolo nacional, não foi ainda aprovado. Certamente as emendas que o corrigem e outras que deverão surgir nas indispensáveis discussões com a população, representada pelos vários segmentos sociais envolvidos, deverão ser consideradas.
Em 03 de outubro de 2010,
Sonia Aquino Mendes